sábado, 23 de abril de 2016

D. Antônio de Castro Mayer. Bispo de Campos - Carta pastoral sobre problemas do apostolado moderno

Parte 1

Dom Antônio de Castro Mayer

D. ANTONIO DE CASTRO MAYER

Por Mercê de Deus e da Santa Sê Apostólica,
Bispo de Campos

Ao Revdo. Clero Secular e Regular,
Saudação, paz e bênçãos em Nosso Senhor Jesus Cristo.

Amados Filhos e zelosos Cooperadores.

  De todos os deveres que incumbem ao Bispo, nenhum sobreleva em importância o de ministrar às ovelhas que lhe foram confiadas pelo Espírito Santo o pábulo salutar da verdade revelada.

  Esta obrigação urge de modo particular em nossos dias. Pois a imensa crise em que o mundo se debate resulta em última análise do fato de que os pensamentos e ações dos homens se dissociaram dos ensinamentos e das normas traçadas pela Igreja; e só pelo retorno da humanidade à verdadeira Fé, poderá esta crise encontrar solução.

  Importa pois, no mais alto grau, lançar unidas e disciplinadas, todas as forças católicas, todo o exército pacífico de Cristo Rei, na conquista dos povos que gemem nas sombras da morte, iludidos pela heresia ou pelo cisma, pelas superstições da gentilidade antiga, ou pelos múltiplos ídolos do neo-paganismo moderno.

  Para que esta ofensiva geral, tão desejada pelos Pontífices, seja eficaz e vitoriosa, cumpre que as próprias forças católicas permaneçam incontaminadas dos erros que devem combater. A preservação da Fé entre os filhos da Igreja é pois medida necessária e de suma importância para a implantação do Reino de Cristo na terra.

  A História nos ensina que a tentação contra a Fé, sempre a mesma em seus elementos essenciais, se apresenta em cada época com aspecto novo. O arianismo, por exemplo, que tanta força de sedução exerceu no século IV, teria interessado pouco o europeu frívolo e voltairiano do século VXIII. E o ateísmo declarado e radical do século XIX teria fracas possibilidades de êxito ao tempo de Wiclef e João Huss.

  Em cada geração, ademais, a tentação contra a Fé sóe agir contra a intensidade diversa. A uma, consegue arrastar inteiramente para a heresia. A outra, sem a tirar formal e declaradamente do grêmio amoroso da Igreja, inflama-lhe o seu espírito, de sorte que, em não poucos católicos que recitam os formulários da Fé, e julgam - por vezes sinceramente - dar uma adesão irrestrita aos documentos do magistério eclesiástico, o coração bate ao influxo de doutrinas que a Igreja condenou.

  É este um fato de experiência corrente. Quanta vezes observamos em torno de nós católicos ciosos de sua condição de filhos da Igreja, que não perdem ocasião de proclamar sua Fé, e que entretanto, no modo de considerar as ideias, os costumes, os acontecimentos, tudo enfim que a imprensa, o cinema , o rádio e a televisão diariamente divulgam, em nada se diferenciam dos céticos, dos agnósticos, dos indiferentes! Recitam corretamente o "Credo" e no momento da oração se mostram católicos irrepreensíveis; mas o espírito que, conscientemente ou não, os anima em todas as circunstâncias da vida é agnóstico, naturalista, liberal.

  Como é óbvio, trata-se de almas divididas por tendências contrárias. De um lado, experimentam em si a sedução do ambiente do século. De outro, guardam ainda, talvez de herança familiar, algo do brilho puro, invariável, inextinguível, da doutrina católica. E como todo o estado de divisão interior é anti-natural ao homem, essas almas procuram restabelecer a unidade e a paz dentro de si amalgamando num só corpo de doutrina os erros que admiram e as verdades com que não querem romper.

  Esta tendência a conciliar os extremos inconciliáveis, de encontrar uma linha média entre a verdade e o erro, se manifestou desde os primórdios da Igreja. Já o Divino Salvador advertiu contra ela os apóstolos: "Ninguém pode servir a dois senhores" (Mt. 6,24). Condenado o arianismo, essa tendência deu origem ao semi-arianismo. Condenado o pelagianismo, ela engendrou o semi-pelagianismo. Fulminado em Trento o protestantismo, suscitou o jansenismo. E dela nasceu igualmente o modernismo condenado pelo Beato São Pio X, monstruosa confluência do ateísmo, do racionalismo, do evolucionismo, do panteísmo, em uma escola apostada em apunhalar traiçoeiramente a Igreja. A seita modernista tinha por objetivo, permanecendo dentro dela, falsear-lhe por argúcias, sub-entendidos e reservas a verdadeira doutrina, que exteriormente fingia aceitar.

  Esta tendência não cessou ainda; pode-se mesmo dizer que ela faz parte da História da Igreja. É o que se deduz destas palavras do Soberano Pontífice gloriosamente reinante, em discurso aos pregadores quaresmais de Roma em 1944: "Um fato, que sempre se repete na História da Igreja, é que quando a Fé e a Moral cristã se chocam contra fortes correntes contrarias e de erros ou apetites viciados, surgem tentativas com intuito de vencer as dificuldades mediante algum compromisso comodo, ou então de se esquivar delas ou fechar-lhes os olhos" (A.A.S. 36, p.73).

***
(Continua)

Dom Antônio, obrigado por dar honra a nossa pátria!

*20/06/1904
+ 25/04/1991



  

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