Respostas precisas a perguntas precisas, respostas de Dom Viganò ao diretor da Catholic World News, Phil Lawler, publicado em seu blog Catholic Culture
21 de junho de 2020
Dominica infra Octavam Ss.mi Cordis Jesu
Caro Doutor Lawler, Recebi seu e-mail através do seu amigo em comum Edward Pentin, no qual o senhor faz algumas perguntas relacionadas ao que eu já expressei sobre o Concílio Vaticano II. Com prazer, respondo-lhe, esperando que essas reflexões ajudem a sanar a Igreja Católica dos graves males que a afligem.
Lawler: Primeiramente, o que o senhor diz sobre o Vaticano II?. Que
as coisas se deterioraram rapidamente depois
dele é certamente verdadeiro. Mas, se o conjunto do Concílio apresenta
um problema, como isso se aconteceu? Como conciliar isso com o que nós pensamos
da inerrância do Magistério?. Como todos os padres do Concílio se enganaram?.
Mesmo se somente certas partes do Concílio, por exemplo, Nostra Aetate,
Dignitatis Humanae são problemáticas, nós somos sempre confrontados com as
mesmas questões. Muitos dentre nós dizem há anos que "o espírito do
Vaticano II" é errôneo. O senhor quer dizer com suas afirmações que o falso
"espírito" liberal reflete fielmente os trabalhos do Concílio?.
Dom Viganò: Eu penso que não seja
necessário demonstrar que o Concílio representa um problema: o simples fato de que
nós coloquemos esta questão sobre o Vaticano II e não sobre Trento ou Vaticano
I me parece confirmar um fato que é evidente e conhecido para todos. Em
realidade, mesmo aqueles que defendem o Concílio com as espadas desembainhadas
o fazem fora de todos os outros concílios ecumênicos precedentes, dos quais
nenhum se classificou como pastoral. E note-se que eles chamam: "O Concílio"
por excelência, como se se tratasse do só e único concílio de toda a história
da Igreja, ou ao menos o considerando como único, seja por causa da formulação
de sua doutrina ou pela autoridade de seu magistério. Foi um concílio que,
diferente de todos os concílios que o
precederam, foi chamado concílio pastoral, declarando que ele não queria propor
uma nova doutrina, mas que criou uma distinção entre o antes e o depois, entre
um concílio dogmático e um pastoral, entre cânones sem equívocos e discursos
vazios, entre anátemas e piscadas de olhos para o mundo.
Há um outro equivoco que deve
ser esclarecido. Se, de uma parte, João XXIII e Paulo VI declaravam que eles
não queriam engajar o Concílio na definição de novas doutrinas e queriam que
ele se limitasse a ser somente um concilio pastoral, de outra parte, é verdade
que exteriormente midiaticamente ou nas mídias, diríamos nós hoje em dia, o
acento colocado em seus atos foram enormes. Essa ênfase serviu para veicular a
idéia de uma autoridade doutrinal presumida, de uma infalibilidade magisterial
implícita, mesmo se estas eram claramente excluídas desde o ponto de partida.
Se este acento foi posto, foi para permitir as instâncias mais ou menos
heterodoxas de serem percebidas como tendo autoridade e então de ser aceitas pelo clero e
pelos fiéis. Mas isso seria suficiente para desacreditar estes autores de um
engano similar, que gritam ainda hoje quando alguém toca em Nostra Aetate, enquanto
se calam quando alguém nega a divindade de Nosso Senhor ou a virgindade
perpétua de Maria Santíssima. Lembremos
que os católicos não adoram um concílio, nem ao Vaticano II, nem a Trento, mas
a Santíssima Trindade, o único verdadeiro Deus; eles não veneram uma declaração
conciliar ou uma exortação pós-sinodal, mas a verdade vinculada nestas atas de
Magistério.
O senhor me perguntou: Como
todos os padres conciliares se enganaram?. Eu
respondo me apoiando sobre minha experiência destes anos e sobre as palavras de
meus irmãos com quem eu tinha engajado uma discussão na época. Ninguém poderia imaginar que em pleno coração
do corpo eclesial, haviam força hostis tão poderosas e organizadas podendo
chegar a rejeitar os esquemas preparatórios perfeitamente ortodoxos que tinham
sido preparados por cardeais e prelados com uma fidelidade fiável à Igreja,
substituindo-os por um pacote de erros habilmente disfarçados por trás de
discursos longos e deliberadamente ambíguos. Ninguém
poderia acreditar, que, sob as abóbodas da Basílica do Vaticano, os Estados Gerais
podiam ser convocados para decretar a abdicação da Igreja católica e a
inauguração da Revolução. (Como eu já tinha mencionado em um artigo
precedente, o cardeal Suenens chamou o Vaticano II de "1789 da Igreja").
Os padres conciliares foram objetos de um embuste sensacional, de uma fraude
habilmente cometida que tinha recorrido aos meios mais sutis: eles se
encontraram em minoria em grupos lingüísticos, excluídos de reuniões convocadas
na última hora, empurrados a dar seu "placet" [aceito] fazendo-lhes
crer que o Santo Padre o queria.
E o que os inovadores não
conseguiram obter na Aula Conciliar eles alcançaram nas Comissões e Comitês,
graças igualmente ao ativismo dos teólogos e peritos que foram acreditados e
aclamados por uma poderosa máquina midiática. Existe uma vasta gama de estudos
e de documentos que testemunham esta mentira sistemática e malévola de certos
Padres do Concílio de uma parte, e de outra do otimismo ingênuo ou da
negligência de outros Padres do Concílio bem intencionados.
A atividade do Coetus Internationalis Patrum [se opondo
aos inovadores] podia somente um pouco ou nada diante da violação das regras
dos progressistas ratificadas na Mesa Santa ela mesma [Pelo Papa].
Aqueles que sustentaram que
"espírito do Concílio" representava uma interpretação heterodoxa ou
errônea do Vaticano II se entregaram a uma operação inútil e prejudicial, mesmo
se eles o fizeram impulsionados pela boa fé. É compreensível que um cardeal ou
um bispo queira defender a honra da Igreja e deseja que ela não seja desacreditada
diante dos fiéis e do mundo, e se pensava então que o que atribuíam ao
concílio era, na realidade, uma falsa
declaração induzida, um forçamento arbitrário. Mas se na época podia ser
difícil de pensar que uma liberdade religiosa condenada por Pio XI (Mortalium
Animos) podia ser afirmada pela Dignitatis Humanae, ou que o Pontífice Romano
podia ver sua autoridade usurpada por um colégio episcopal fantasma, se
compreende hoje que o que foi habilmente oculto no Vaticano II é hoje afirmado ore rotundo [linguagem pomposa] nos
documentos pontificais precisamente em nome de uma aplicação coerente do
Concílio.
De outra parte, quando nós
falamos correntemente do espírito de um evento, nós queremos exprimir
precisamente o que constitui a alma, a essência deste evento. Nós podemos então
afirmar que o espírito do Concílio é o Concílio ele mesmo, que os erros do
período pós conciliar estavam contidos in nuce [em semente] nos atos
conciliares, igualmente como é dito justamente que o Novus Ordo é a missa do Concílio, mesmo se em presença dos Padres
conciliares foi celebrada a missa que os progressistas chamam significativamente
"pré-conciliar". E ainda: Se o Vaticano II não representasse
verdadeiramente um ponto de ruptura, qual seria a razão de falar de uma Igreja
pré-conciliar e de uma Igreja pós-conciliar, como se ele tratasse de duas
entidades diferentes definidas em sua essência pelo Concílio ele mesmo?. E se o
Concílio estava verdadeiramente alinhado com o Magistério infalível
ininterrupto da Igreja, por que ele é o único Concílio que apresenta graves e
sérios problemas de interpretação?, demonstrando sua heterogeneidade ontológica
com relação aos outros Concílios?.
Lawler: Em segundo
lugar, qual seria a solução?. Dom Schneider propõe que um futuro Pontífice deve
repudiar os erros; O bispo Viganò encontra isso insuficiente. Como então
corrigir os erros, de maneira a manter a autoridade do ensinamento
magisterial?.
Dom Viganò: A solução, a meu ver, reside antes de tudo
em um ato de humildade que cada um entre nós, a começar pela hierarquia e pelo
Papa, deve cumprir: reconhecer a infiltração do inimigo no coração da Igreja, a
ocupação sistemática dos postos chaves na Cúria Romana, os seminários e as escolas eclesiásticos, e
a conspiração de um grupo de rebeldes - compreendida aí, em linha de frente, a desviante companhia de Jesus que
conseguiu dar a aparência de legitimidade e de legalidade à um ato subversivo e
revolucionário. Nós devemos igualmente reconhecer a insuficiência da
resposta do bem, a ingenuidade de muitos, o temor de outros e os interesses
daqueles que se beneficiaram graças a este complô. Depois de sua tríplice
negação do Cristo na corte do sumo sacerdote, Pedro "flevit amare",
chorou amargamente. A tradição nos diz que o príncipe dos apóstolos tinha dois
pequenos vales em suas bochechas até o fim de seus dias, seguidas das lágrimas
que ele copiosamente derramou, se arrependendo de sua traição. Pertencerá a um
de seus Sucessores, o Vigário de Cristo, na plenitude de seu poder apostólico,
de reunir o fio da Tradição lá onde ele foi rompido. Isso não será uma derrota
mas um ato de verdade, de humildade e de coragem. A autoridade e a
infalibilidade do Sucessor do Príncipe dos Apóstolos sairão intactas e
reconfirmadas. De fato, elas não foram colocados em dúvida no Vaticano II, mas
ironicamente, elas o seriam no dia onde um Pontífice corrigisse os erros que este Concílio permitiu, brincando assim com
o equívoco de uma autoridade que ele oficialmente negou ter, mas que os fiéis
foram sorrateiramente autorizados a compreender que a Hierarquia toda inteira
tinha, começando pelos papas do Concílio.
Eu faço questão de lembrar que
para certas pessoas, o que é exprimido aqui em cima pode parecer excessivo,
pois isso pareceria colocar em causa a autoridade da Igreja e dos Pontífices
Romanos. Portanto, nenhum escrúpulo impediu a violação da Bula Quo Primum tempore, de São Pio V,
abolindo da noite para o dia, toda a liturgia romana, o venerável tesouro
milenar da doutrina e da espiritualidade da Missa Tradicional, o imenso
patrimônio do canto gregoriano e da música sacra, a beleza dos ritos e dos
paramentos sacros, desfigurando a harmonia arquitetural mesma das basílicas as
mais distintas, suprimindo as balaustradas, os altares monumentais e os sacrários:
tudo foi sacrificado sobre o altar "coram populo" [de frente para o
povo] da renovação conciliar, com a cinscunstância agravante de ter feito isso
unicamente porque esta liturgia era admiravelmente católica e inconciliável com
o espírito do Vaticano II.
A Igreja é uma instituição Divina,
e tudo nela deve começar por Deus e retornar a Deus. O que está em jogo não é o
prestígio de uma classe dirigente, nem a imagem de uma empresa ou de um
partido: se trata aqui da glória da majestade de Deus, de não anular a paixão
de Nosso Senhor sobre a Cruz, dos sofrimentos de sua Mãe Santíssima, do sangue
dos mártires, do testemunho dos santos, da salvação eterna das almas. Se, por
orgulho ou infeliz obstinação nós não sabemos reconhecer o erro e a fraude nas
quais nós caímos, nós deveremos prestar contas a Deus, que é igualmente
misericordioso com seu povo quando ele se arrepende e implacável em justiça
quando eles seguem Lúcifer em seu "non serviam" [não servirei].
Caro Doutor Lawler, a vós e a
vossos leitores, eu envio cordialmente meus comprimentos e a benção de Nosso
Senhor, por intercessão de Sua e de Nossa Mãe Santíssima.
+Carlo Maria Viganò
Fonte: FONTE PRIMÁRIA
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